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31 dezembro 2017

Adeus a 2017

Já aqui disse que antes de devolver os cogumelos à terra, reúno-os todos para uma despedida em grande finale. É com uma delas que digo adeus a 2017, ano micologicamente venturoso, apesar da seca séria, que está longe de estar resolvida. É também nesta klimtiana que seguem votos de uma passagem alegre do velho para o novo ano.

30 dezembro 2017

Monstros

Num passeio por montes e campos, desmunida do arsenal de acessórios que normalmente anda comigo, não resisti ao apelo desta pedra de muro polvilhada do branco de uma geada inclemente. Foi só dar uns passos e achei um Amanitas muscaria, que logo rodeei das folhas que por ali havia. A fotografia revelou-me a cabeça de qualquer coisa entre um peixe e um réptil. Vendo melhor, com aquele olho único e vermelho, só pode ser um cíclope. A criação involuntária de um monstro reforça-me a consciência do fascínio por estas entidades fictícias. É que enquanto são destas criaturas, fantásticas, fabulosas fingidas, folgam as costas do arrostar os monstros reais, verdadeiros, diários, ocasionais, visíveis, invisíveis e inevitáveis.

29 dezembro 2017

Mioleira ou couve-flor?

A composição de hoje tem mais ar gastronómico do que decorativo. Esta aparência resulta da citação marisqueira assegurada pelas conchas e pela forma do fungo que está no interior da concha grande: é mioleira ou couve-flor? Na verdade, é por este último nome que é conhecido. É tão inesperado que eu julgava-o criatura apenas dos livros, até ao momento em que parei o carro junto de um talude alto para colher um Bolletus edulis e avistei, a uns 10 metros, esta forma estranha. Claro que a alegria que tal achado me injectou foi suficiente para exilar uma série de angustiazinhas quotidianas. O Google — meu poderoso aliado em matérias relativas aos fungos — informa-me que esta couve-flor tem o nome de Sparassis crispa e que é comestível (lá está a coisa a fu(n)gir para a mesa...). Não tenciono prová-la, por temor antigo de degustações de cogumelos, mas também porque me lembra uma esponja. E foi isto que me levou a metê-la dentro da concha.

28 dezembro 2017

Simplicidade

Perguntaram-me se me dá mais prazer uma composição trabalhosa ou uma simples. Em primeiro lugar, convirá lembrar que aquilo que parece simples nem sempre o é. Por vezes, resulta de um longo processo de tira-e-põe, de faz-desfaz-refaz; em segundo lugar, esta trabalheira pode desaguar na frustração, na canseira (naquele «estava a ver que nunca mais»), mas também no carinho especial, forjado, precisamente, nas voltas e contravoltas da confecção da coisa. Posto isto, à pergunta que me fizeram, para ser verdadeira, só posso responder desta irritante maneira: «depende».

26 dezembro 2017

Tradição e percepção

A sensação de que a composição de hoje continua com evocações natalícias depende, creio, da presença de elementos como a pinha, o vermelho e o verde. É curioso verificar como as tradições nos enformam a percepção.

24 dezembro 2017

Bom Natal

Bom Natal a todos os amigos, seguidores, gostadores e “likadores” das composições da Maria Natura.

23 dezembro 2017

Farewell party

Não será necessária a atenção de um olhar examinador para constatar que reutilizo os cogumelos até ao limite da fotogenia — ou talvez para além disso. Antes de devolver à terra os que ficam fora de prazo, integro-os numa composição em que incluo todos os que tenho no momento, dando-lhes/me a oportunidade de uma despedida festiva.

21 dezembro 2017

Saturnália

Quando encontro cogumelos menos frequentes não paro enquanto não sinto extinto o afã produtivo. No caso deste, Coprinus comatus, o stress aumenta muito, porque só é utilizável durante algumas horas depois de colhido. Depois disso, liquefaz-se numa repugnante tinta negra. Apesar deste senão, é muito versátil, pelo que talvez seja o meu preferido, dos que encontrei até ao momento. E porque lembra uma taça romana, da cultura pagã, portanto, serve para celebrar o solstício de Inverno.

20 dezembro 2017

Leitugas

No auge de um frenesi de que me senti acometida no Domingo passado, subitamente, considerei estafado o acervo de materiais acessórios aos cogumelos. Senti-me como a personagem feminina do já mítico anúncio a uns célebres bombons: apetecia-me algo... À falta de um Ambrósio de modos delicados e eficazes, com o automóvel atulhado de elementos compositivos usados até à exaustão, procurei na berma da estrada em cujo muro trabalhava e reparei em duas viçosas leitugas. Sempre apreciei a forma de estrela e as cores destas plantas capazes de se darem em focinho de cão. Sendo tão frequentes, foi sem escrúpulos que, em menos de um ai, as passei a fio de faca e as integrei neste assemblage.

19 dezembro 2017

Indecisões

Três coisas sobre estas três composições: não consigo eleger a favorita desta série em forma de estrela; peço desculpa pelas fotografias possíveis nas condições de luz e máquina; encontrei este cogumelo relativamente raro — Coprinus comatus — no meio de um jardim público da cidade. (Se alguém vir algum, agradeço que me avise; é muito fácil de identificar, parece um guarda-chuva fechado.)

17 dezembro 2017

Ninho

Nesta composição tentei fazer como algumas aves, aproveitar um buraco num tronco para um ninho. Que pássaro sairá daqui, não sei, mas se sair ao cogumelo grande, poderá chamar-se como ele: Russula fragilis.

15 dezembro 2017

Tronccata und Funghi III

De regresso às Tronccata und Funghi e às composições que puxam à silhueta de peixe exótico. Esta inclui um elemento alóctone e um autóctone bizarro. O primeiro é óbvio, é a cauda de ramo de palmeira; já o segundo é mais difícil. Refiro-me ao pedaço branco de resina de pinheiro que se encontra sobre a direita, na parte de cima do cogumelo central, a Amanitas muscaria. Encontrei-o no chão, a menos de 150 metros do tronco. O andamento adequado parece-me poder ser o andante con spirito.

14 dezembro 2017

Rapidinha

O dia é de chuva, situação meteorológica que devia ser considerada «bom tempo», depois de uma seca tão preocupante. A composição foi feita em dia de sol e geada, como o testemunha a fotografia, e resulta de uma vontade súbita de fazer uma coisa simples. Et voilà, c'est fait!

13 dezembro 2017

Tronccata und Funghi II

É quase sempre possível contar uma história sobre o momento da recolha de materiais destas composições. As conchas desta foram apanhadas por exortação de uma amiga admiradora de Sophia, a quem eu queria mostrar a Granja. Era o momento exacto do pôr-do-sol e ainda estávamos na Aguda. Ela reparou que a praia estava cheia de conchas. Por breves minutos, revivemos a alegria infantil de escolher ouriços, mexilhões, lapas, beijinhos. Levei-as para a montanha, onde dei com um tronco lateralmente recamado de cogumelos dispostos em escamas. Parecia que clamava pelos adereços achados na praia da Aguda. Juntei-lhe umas Macrolepiotas venenatas encontradas in loco e o resultado foi esta Tronccata und Funghi em vivace, que dedico à Lina Sampaio.

11 dezembro 2017

A base, a basezinha

Uma das minhas bases favoritas é cortiça. Conheço um lugar onde recolho muitos pedaços junto da água, na praia criada pelas secas longas. Uma amiga, ao ver esta composição, disse que pareciam rodelas de laranja. Segundo pesquisa própria, as “rodelas de laranja” maiores serão falsos cantarelos (Hygrophoropsis aurantiaca) de edibilidade não recomendada, o que é pena, pois são muito abundantes. Nas matas escuras pelos fetos altos e cerrados parecem luminárias dispersas por algum nume caprichoso.

10 dezembro 2017

Tronccata und Funghi I

Apesar de já ter publicado uma composição feita sobre um tronco, vai ser esta a que inaugura a longa série «Tronccata und Funghi». A outra fica a servir de pré-publicação, em jeito de amuse-gueule. Tentarei subclassificá-las com os andamentos musicais que considerar conformes à dimensão, cor(es), complexidade (ou confusão...) de cada uma. Assim, esta segue como um adagietto.

09 dezembro 2017

Pedro e os líquenes

E porque com a chuva os líquenes ficam exuberantes, hoje publico uma composição com uma Cladonia rangiferina — ou será stellaris? — como protagonista.

O interesse pelos líquenes já conta mais de 10 anos, no tempo em que criei o “Pedro Rocha Calhau”, persona que se dedicava a fotografar líquenes das pedras. Mais recentemente, passei a reparar neles com olhar armado de critérios decorativos e devo confessar o meu espanto com a variedade que pode existir num pequeno tronco de árvore, num muro, num metro quadrado de fraga ou de chão. Esclareço que o polvilho branco que se espalha por fora da linha de cogumelos é geada. Geada rija.

08 dezembro 2017

Estranha forma de vida

Em dia de chuva — bendita seja! — e quase a sair da estação-rainha dos cogumelos, é tempo de buscar o que se guardou em dias de produção copiosa. Sinto que esta composição saiu um híbrido entre flor e peixe. Peixe, apesar das penas.

06 dezembro 2017

O tóxico e o exótico

A estes cogumelos maiores esverdeiam-lhes bastante as lâminas depois de cortados. Isso dá-lhes um ar assustadoramente tóxico. Ainda bem que é assim, pois, pelos vistos, são-no mesmo. O nome, Hypholoma fasciculare, com aquela terrível terminação em «-oma» também causa o seu arrepio. Eu uso-os porque os acho bonitos e porque são bastante comuns. Encontro-os nos troncos em decomposição, em colónias de dimensão bastante variável: de dois ou três vizinhos até aldeias bem compostinhas. A folha avermelhada é do arbusto de sumagre, muito frequente no Douro. Esta palavra tem qualquer coisa de exótico — e nada de tóxico.

04 dezembro 2017

O Micófago

Ao dispor os materiais, não me apercebi de que compunha a figura revelada pela fotografia: esta espécie de monstro papa-cogumelos. Ouço as vozes especulativas dos que procuram — e conseguem encontrar — sentidos ocultos nas coisas («o que será que isso quer dizer?», «nada é por acaso», «de que sótão te saiu isto?»...) e sorrio, não tanto destas previsíveis hipóteses, mas mais porque me ocorre aquele dito de Oscar Wilde a propósito do auto-retrato...

03 dezembro 2017

Elegia

As pobres árvores têm muitos inimigos, que as cortam e queimam pelas mais peregrinas razões. Esta verdadeira «sanha arboricida», sobre a qual escreveu João Araújo Correia, tem adeptos nas cidades e nas serras. Naquelas, o arranque dos troncos disfarça a matança, a subsequente sepultura de cimento garante o esquecimento rápido da sombra e da beleza que enriqueceram o lugar; nas montanhas,deixam-lhe um cepo de altura variável entre uma mão travessa e a perna até ao joelho. Se estivessem dispersos, não seria tão aflitivo; como são muitos e juntos, lembram os cotos dos amputados e é inevitável aquele lamento íntimo pelas mutilações e mortes dispensáveis. Usá-los como base de apoio a algumas composições é a minha elegia possível.